Remoção de favela completa ligação da ponte estaiada com a especulação




As últimas 46 famílias que restam na favela do Jardim Edite têm de deixar até o final do mês o local espremido entre a muralha de prédios modernos e a ponte estaiada, novo cartão postal monumental de São Paulo. Os barracos de madeira e as casas de alvenaria torta estão em processo de demolição em meio ao cenário "globalizado" que marca a paisagem da região.

"A ponte foi criada como chamariz para o mercado imobiliário, por seu caráter espetacular, afinal, não precisaria daquela estrutura toda para a transposição do rio tão estreito. É para criar uma marca de distinção, inventar uma centralidade para o empresariado. Por isso, era importante para a prefeitura e as empresas tirar a favela dali", analisa a urbanista Mariana Fix, que desenvolve seu doutorado na USP tendo como assunto essa região que fica entre os bairros do Itaim Bibi e o Brooklin, escolhida para albergar a chamada "nova economia" no país.

Há 30 anos, quando essa região era pontilhada de bairros populares, o metro quadrado valia US$ 100. Com a construção sobre o rio Pinheiros e a saída das favelas, esse índice pulou de US$ 1.500 para US$ 4.000. Não por nada Fix intitulou uma palestra sua com o nome "Uma ponte para a especulação (ou a arte da renda nas margens do rio Pinheiros)".

A pesquisadora da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo) desconfia também que os apartamentos do conjunto habitacional que será construído no lugar da favela logo sairão das mãos das 278 famílias beneficiadas, do total de 900 que viviam por lá. "Os apartamentos parecem dirigidos a outro perfil de morador. Pode virar em poucos anos uma Cohab de luxo para funcionários médios dos escritórios vizinhos. Tem até elevador, o que encarece sua manutenção", afirma Fix. A prefeitura argumenta que pode coibir, mas não proibir que se loque ou se subloque o imóvel.

O mesmo pé atrás têm os removidos. "Esse despejo é para roubar a gente. O prédio que vão fazer aqui é para doutorzinho de gravata", resume o pedreiro Francisco Souto, que vai muito mais longe em sua teoria. "Acho que o [George] Bush tem interesse nessa área. Quando ele veio aqui no Brasil, ficou nesse hotel do lado. Foi uma confusão", lembra da passagem do ex-presidente norte-americano em visita oficial à cidade em 2007.

Muro da favela que foi destruido
O prefeito Gilberto Kassab tinha a intenção de desmontar a favela para a inauguração (há um ano) da ponte estaiada, que recebeu o nome de Octavio Frias de Oliveira, publisher do jornal de Folha de S. Paulo morto em 2007.

Mas um mês antes uma ação da Defensoria Pública e da Associação de Moradores do Jardim Edite barrou essa intenção. O recurso, com base no Plano Diretor de 2002 da cidade que determinava a área como de "interesse social", obrigou a prefeitura a acertar um plano de remoção e construção de moradia no local, o que ia além do cheque-despejo de R$ 5 mil.

Após a decisão judicial, ficou acertada uma retirada até maio de 2009, com os moradores recebendo R$ 500 mensais até receberem de volta um lugar para morar ou sendo deslocados para unidades do CDHU nas zonas periféricas do oeste e do sul do município para continuar tendo suas casas próprias

Segundo a secretaria municipal da Habitação, o conjunto habitacional será construído em 18 meses após a derrubada completa dos três quarteirões que compõe a favela. Além disso, há uma operação urbana para outras favelas da região do Brooklin, incluindo um túnel para ligar a avenida Roberto Marinho ao complexo Anchieta-Imigrantes, informou a assessoria da secretaria.

A Defensoria só saiu do caso quando os moradores declararam que voltariam atrás no acordo de retirada, o que aconteceu após narcotraficantes do bairro ameaçarem quem aceitasse o acordo para sair e sequestrarem lideranças do bairro. Sobrou intimidação também para os funcionários municipais que iam ao bairro providenciar a saída dos habitantes.

Os criminosos queriam manter no local o que foi classificado como um "drive-thru de drogas", afinal, os vizinhos endinheirados e os boêmios da Vila Olímpia estacionavam seus carros na entrada da favela para comprarem entorpecentes.

O caso policial virou investigação no Ministério Público, mas o processo de remoção continuou até o dia até agora, quando as famílias restantes vivem entre os escombros das outras casas.

"O processo todo tem por trás mais de 20 anos de luta por parte da população e anormalidade por parte das administrações municipais", lembra Fix, que escreveu o livro "Parceiros da Exclusão", que levantou que 95% dos favelados removidos tiveram uma piora em sua qualidade de vida, nas encostas dos barrancos perto dos mananciais.

Esse estudo mostra como a parceria entre prefeitura e empresas transformaram uma várzea de casebres e vielas na skyline que configura no Brasil o padrão cosmopolita, com direito a uma ponte que se repete em Hong Kong, Amã ou Lisboa para dar o toque de leveza arquitetônica tão ao gosto do mercado financeiro, que também instalou escritórios por essa região paulistana. Popularmente, porém, a ponte paulistana recebeu o nome de "estilingão" por seu formato.
Fios da ligaçao clandestina
Quem passa pela marginal ou desce de avião rumo ao aeroporto de Congonhas avista esse cenário de aço, concreto e vidro que recobre hotéis de luxo, shopping centers e sedes de banco, canal de TV e condomínios de alto padrão.

Essa São Paulo empresarial saiu do vale do Anhangabaú, rumou para a avenida Paulista, para a Faria Lima e finalmente se endereçou para essa parte da margem do rio Pinheiros. Desde o governo de Jânio Quadros (1986-88), passando pelos despejos promovidos pela gestão Paulo Maluf (1993-96) até o início das obras da ponte sob Marta Suplicy (2001-04), a questão chega até essa segunda administração Kassab, que teria como foco a revitalização do centro antigo, principalmente com o projeto "Nova Luz", cujo execução ficará na mão de uma concessionária.

"A disputa entre revitalização do centro e o investimento em outra região como a do Brooklin faz a cidade parecer um monstro de duas cabeças", opina Fix.

Os barracos do Jardim Edite se formaram a partir de 1962 em terreno que pertencia ao DER (Departamento de Estradas de Rodagem), como outras favelas vizinhas. Essas comunidades ganharam sua cara aparente com o rapper Sabotage, criado nos becos do Brooklin para se destacar na música negra da virada do século. Ele foi assassinado em 2003. Desapareceu antes do bairro em que cresceu também desaparecer.

Os barracos do Jardim Edite se formaram a partir de 1962 em terreno que pertencia ao DER (Departamento de Estradas de Rodagem), como outras favelas vizinhas. Essas comunidades ganharam sua cara aparente com o rapper Sabotage, criado nos becos do Brooklin para se destacar na música negra da virada do século. Ele foi assassinado em 2003. Desapareceu antes do bairro em que cresceu também desaparecer.

Os barracos do Jardim Edite se formaram a partir de 1962 em terreno que pertencia ao DER (Departamento de Estradas de Rodagem), como outras favelas vizinhas. Essas comunidades ganharam sua cara aparente com o rapper Sabotage, criado nos becos do Brooklin para se destacar na música negra da virada do século. Ele foi assassinado em 2003. Desapareceu antes do bairro em que cresceu também desaparecer.

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